O táxi como negócio - Taxista Empreendedor

sábado, 15 de setembro de 2012

Taxista oferece transporte, música e poesia na capital

Motorista de táxi aproveita as horas de trabalho no trânsito de Belo Horizonte para vender aos clientes CDs e livros que grava e escreve, quase sempre enaltecendo Minas 

 Se entrar no táxi em uma rua ou avenida da Região Centro-Sul de BH e, de repente, motorista começa a cantar, em ritmo de marchinha, “Belo Horizonte, a capital mineira, agraciada com a Serra do Curral, agraciada com a Lagoa da Pampulha, Jardim Zoológico e Parque Municipal”, estará no Palio placa OLX 0458. O cantor, sem dúvida, é José Antônio de Souza, o Zantoni, de 61 anos, pai de três filhos e duas vezes avô, autor de músicas que enaltecem os valores de Minas e de sua gente. Com dois CDs gravados e quatro livros publicados, ele é uma agradável surpresa no trânsito caótico da cidade.

Caso o passageiro não queira ouvir as canções da boca do próprio autor, pode pedir para ligar o som do carro ou comprar um dos CDs para ouvi-lo em casa e apreciar a criatividade do homem que dirige um táxi como diarista – para R$ 110 por dia ao dono da placa e do veículo – e aproveita o trabalho para divulgar e comercializar sua arte. A presença de Minas é intensa em sua obra. As músicas falam de cidades, suas raízes, riquezas e cultura, em ritmos diferentes. O sertão de Montes Claros, o barroco de Ouro Preto, os festivais de Tiradentes e, de brinde, canções dedicadas a Atlético, Cruzeiro, América e Seleção Brasileira.

Zantoni nasceu em BH. Foi criado nos bairros Cachoeirinha e Santa Cruz, Região Nordeste. Não completou o segundo grau, mas tem diploma de técnico em mecânica. Essa formação o levou ao cargo de consultor técnico em uma montadora de veículos. Perdeu o emprego em 1983 e, diante da dificuldade de voltar à função em outra empresa, começou a trabalhar como taxista. Anos depois, chegou a ter o próprio carro de aluguel, mas o vendeu para abrir um negócio de reciclagem de sacaria. Traído pelo sócio, faliu e voltou à praça.

Poesia
Com a poesia nas veias, mostrava suas canções aos passageiros. Incentivado, gravou o primeiro CD, Patrimônio de Minas, em 2007. Abriu o trabalho com a música Estrada Real, na qual rima as maravilhas histórias dos ciclos do Ouro e do Diamante. No mesmo disco, homenagens a Oscar Niemeyer e a seu legado arquitetônico a Minas, a Juscelino Kubitschek, que trouxe o arquiteto para desenhar o complexo da Pampulha. Canta também Ouro Preto, Diamantina, BH, os três grandes clubes de futebol do estado e mais o Villa Nova e o Ipatinga. Gastou R$ 5 mil no projeto independente.

“Só aqui no táxi vendi 3 mil cópias”, diz Zantoni. Entusiasmou-se e partiu para o segundo trabalho, Patrimônio de Minas II , com cerca de 300 cópias já vendidas. Nesse segundo disco, a marchinha dedicada a BH está acompanhada de letras que destacam os valores de Divinópolis, Pirapora, Uberaba, São Lourenço e outras cidades. Como brinde, a última faixa são Roteiros para cavalgar. Já está na fila o terceiro CD, que deverá ser gravado em breve.

“O novo disco contém poemas musicais”, revela. De onde vem a inspiração? “Algumas letras já gravadas foram sugeridas por passageiros e outras tirei de cadernos de turismo dos jornais.” Zantoni faz música porque gosta; gosta de escrever e criar. “Quem entra no táxi gosta e me enche de elogios.” Além do gosto pelos passeios pela memória de Minas, interessa-se também por temas sociais, mas isso ele deixa para a literatura. Se entrar no Palio OLX 0458 e o motorista rodar um CD com letras enaltecendo Minas e simplesmente cantar, não se assuste: ele dirige cuidadosamente e garante que nunca perde a cabeça no trânsito. “Sou tolerante.”

Desfile de histórias
Questões sociais e familiares e outros problemas que fermentam a reflexão são temas dos quatro livros já publicados por Zantoni. O quinto, que em breve estará a caminho da editora, contém casos vividos no táxi. Há o do mendigo, cliente antigo, que faz ponto na região da Savassi. Como haveria um evento político na área, o mendigo ligou e pediu ao taxista para buscá-lo. “Ele queria mudar-se para um lugar mais tranquilo para pedir, longe do rebuliço político.”

Zantoni pegou o mendigo e, como era dia de jogo da Seleção Brasileira, o taxista tentou sintonizar uma emissora no rádio do carro. Estava difícil. O mendigo simplesmente tirou um celular ultramoderno do bolso, sintonizou-o no canal de TV que transmitia a partida e o pôs no painel do carro. “Tenho outros clientes que são pedintes. Um deles chega a arrecadar R$ 300 por dia.”

“Sabe que já transportei a Loura do Bonfim? Bonita, com um vestido longo. Desceu diante do cemitério. Era uma atriz que ia gravar um documentário sobre a lenda. Não cheguei a ver o filme.” Os livros, Zantoni comercializa no próprio táxi, assim como os CDs. As quatro obras já editadas, do próprio bolso, são Psiu, Brasil, Psiu, Brasil II, Maná 2000 e Coração de ouro. “Os livros têm um grande fundo de reflexão”, diz Zantoni, que procura patrocínio para ver suas obras levadas a grupos culturais. Mais sobre o autor no blog taxistaescritor.blogspot.com.

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